Na política, a singularidade das decisões é uma consequência
da pluralidade. Para crises políticas diferentes, e são sempre diferentes entre
si, deve haver respostas diferentes. A queda do XX Governo Constitucional é um
bom exemplo.
Não há regras gerais, no campo da política, aliás, a política
é a possibilidade do novo, do imprevisto e do espontâneo, num contexto de
pluralidade (diferentes entre iguais), onde se jogam, pelas palavras e pelo
discurso, os assuntos humanos. A única regra geral é não haver regra geral, ou
seja, a liberdade é o pressuposto fundamental da actividade política.
Referimo-nos, naturalmente, à acção política propriamente dita, às palavras e
ao discurso, ou seja, aos conteúdos. Uma liberdade garantida pelas instituições
e pelas leis, tal como os muros da polis
garantiam a liberdade na polis, tal
como a Constituição garante a democracia portuguesa. Quem não percebe isto, nasce
politicamente morto.
O XX Governo Constitucional foi formado por Passos Coelho, o
cabeça de lista do partido (coligação, vá) mais votado, a convite do presidente
da República, cumprindo-se a Constituição e a tradição. Prometida estaria a
continuidade da crise política (porque apolítica) e da asfixia social, uma vez
que tal governo pouco difere do seu antecessor. Mais quatro anos de neo-liberalismo
em estado puro, protagonizados por Passos Coelho (muito longe da social-democracia
que deveria representar), e pelo seu eco, Paulo Portas (esse sim, um homem da
direita radical apesar do populismo). Uma parelha que chumbou em todos os
objectivos a que se propôs, chumbo confirmado pelos indicadores nacionais, dos
quais se sublinha o da dívida pública, o objectivo mais cego do governo XIX.
Dá-se o caso de haver quatro partidos que, não obstante as
suas diferenças, são coincidentes na vontade de interromper o ciclo de
destruição do tecido social e político português. Quatro partidos que, somados,
são maioria em Assembleia da República. Esta é a circunstância motriz do
momento actual, à qual a maturidade política da esquerda não foi indiferente. Em
boa hora.
O XX Governo foi rejeitado pela Assembleia da República, que
é, para efeitos de memória presente, «… um dos órgãos de soberania consagrados na
Constituição, além do Presidente da República, do Governo e dos Tribunais, é,
nos termos da lei fundamental, “a assembleia representativa de todos os
cidadãos portugueses”». Assim está escrito no portal da AR.
A união à esquerda é um acto livre, legítimo e democrático,
uma resposta diferente para uma circunstância diferente. Não há ofensa à
democracia, há sim novidade. Uma novidade para nós, portugueses, mas uma
prática comum nas democracias mais maduras como são, por exemplo, a da
Dinamarca e da Noruega. Sinal de amadurecimento da política portuguesa? Assim o espero.
União à esquerda. Uma acção concreta e definida, como outra
coisa qualquer, apenas… à esquerda. Uma esquerda equilibrada pela diferença dos
quatro partidos e, por isso, sem perigo de extremismos.
Quanto a nós, cidadãos deste país, crianças, jovens, adultos
e velhos, voltamos a ser o principal tema das negociações. Que assim seja.
FC/11Nov2015