sexta-feira, 8 de abril de 2016

Fico assim sem você













Para o João Eduardo Ferreira

Almoço sem batata
Conversa sem vinhaça,
Sou eu, assim sem você
...
Ausência na open-jaula
Ginásio sem "Fernanda Paula!"
Sou eu, assim sem você
...
Porque é que tem de ser assim
A bicharada  não tem fim
És preciso a todo o instante
Nem mil aves cantantes
Vão poder passar sem ti
...
Eu não resisto sem saber o Quê
Eu não insisto sem o meu amigo
São muitas horas sem poder escrever
A caneta está de mal comigo.
Porquê? Porquê?

FC/Abril2016

[Texto inspirado em Fico assim sem você, de Adriana Calcanhoto]


quinta-feira, 7 de abril de 2016

A sombra das mulheres (parte II)














Retalio o belíssimo texto de João Eduardo Ferreira, que reflecte com precisão uma das partes do filme. Direi apenas que não é, na minha opinião, a principal ou a mais importante.

Na minha perspectiva, Phillippe Garrel coloca a tónica da história não na intimidade de ambos mas na intimidade de cada um dos protagonistas, em separado. O que interessa não é o motivo da traição mas o que acontece depois disso.

O cineasta oferece-nos um olhar lacónico sobre a intimidade feminina e a intimidade masculina, separadas pela dupla traição conjugal ou separadas porque assim o foram sempre, por definição, por liberdade de cada um, porque são duas pessoas e não uma, apesar de partilharem as mesmas pulsões, os mesmos afectos, as mesmas paixões, os mesmos desencantos, amando-se por igual. Eis a primeira questão.

A reacção de cada um dos protagonistas à traição do companheiro parece cumprir os preceitos do preconceito social. No homem, permanece o eixo narcísico em torno do qual se agita agora um ciúme obsessivo em relação à mulher. Não questiona, em momento algum, a sua própria traição, que apenas abandona por não conseguir suportar-se enquanto homem traído. Na mulher, o perdão é imediato e o desejo da normalidade também. Por cultura ou maturidade, ficará ao critério do espectador.

Phillippe Garrel não dá respostas. Coloca-nos perante dois sujeitos morais distintos confrontados com a mesma situação, onde o certo e o errado parecem variar de acordo com o género masculino e feminino. O cineasta utiliza a subtileza e a ironia para trazer à tona (ou aprofundar, como queiramos) a dupla moral e os dogmas sociais que a suportam. Dois sujeitos morais distintos? Eis a segunda questão.

O abraço final é a resposta a todas as questões.

FC/Abril2016

sexta-feira, 1 de abril de 2016

A sombra das mulheres

















Título original:
L'Ombre des Femmes
De:
Philippe Garrel
Com:
Clotilde CourauStanislas MerharLena PaugamVimala Pons
Género:
Drama
Outros dados:
FRA/SUI, 2015, Cores, 73 min.



L'Ombre des Femmes, do realizador francês Philippe Garrel, conta-nos a história de uma dupla traição conjugal, catalisadora do ciúme, do anseio, do medo e do amor, entretanto esquecido por entre as paredes de papel florido e com marcas de humidade, de uma casa decadente.

Pierre e Manon, interpretados por Stanislas Merhar e Clotilde Courau, formam um casal aparentemente perfeito, com ela sempre na sombra dele, um realizador fracassado, melancolicamente entretido com a realização de um filme-documentário de um velho resistente francês. A realização deste trabalho sem recursos financeiros é, na verdade, o único elo do casal. O que sobra é o silêncio e a nostalgia, olhados a preto e branco, e a busca da felicidade momentânea em braços alheios.

O peso da cultura ocidental recai sobre ambos, marcando a forma como cada um encara a traição, a sua e a do outro. A amante dele utilizará o preconceito e o narcisismo masculino para prolongar a relação, bebendo da mesma consciência moral. Homem e Mulher, prisioneiros dos dogmas sociais, onde o certo e o errado variam de acordo com o género masculino e feminino. Dois sujeitos morais distintos.

Philippe Garrel mostra-nos um homem e duas mulheres, limpos de todos os excessos tecnológicos e ruídos populares. Tão reduzidos à sua existência que saímos do cinema sem ter a certeza de termos visto algo mais do que uma história banal. A ironia do filme bate-nos mais tarde, no silêncio da reflexão, revelando subtilmente a essência das mulheres num mundo que insiste em as manter na sombra da sua própria intimidade.


FC/Abril2016