Embora cobra que não ande não coma sapo, saibam que a
política não deve confundir-se com a ocasião que faz o ladrão, mesmo sabendo
que ladrão que rouba a ladrão tem cem anos de perdão. Já cansa a moralidade do
papagaio que come o milho, deixando o periquito levar a fama. Já não se aguenta
a pimenta nos olhos dos outros (que somos nós) a saber-vos a refresco. Mais vos
vale um pássaro na mão que dois a voar, bem sabemos e bem sentimos, mas
lembrai-vos: água mole em pedra dura, tanto dá até que fura. Somos gatos
escaldados, não queremos mais água, nem fria nem quente.
Se há provérbios a modificar, tomem lá um: casa onde não há
razão, todos ralham e ninguém tem pão. É isto, senhores! É isto. É isto que
vivemos, uma casa onde todos os princípios são voláteis. Que diabo é este frenesim
de não respeitar os signos, os compromissos, o senso comum, as pessoas, o povo,
a Língua? Chega! Não queremos ser brioches nem fantoches.
Os palhaços têm lugar no circo, não na vida que nasce torta.
Insistir no populismo e na ignorância é caminhar a passos largos para o erro.
Sim, sim, errar é humano, como pisar duas vezes na mesma pedra. Nenhum outro
animal o faz, só o tolo do homem porque se esquece da capacidade dos sentidos.
De todos os sentidos, o do político também. Esquece muito a quem não sabe, pois
é. Falta de vida vivida e também de leitura, de Literatura, de História, de
Filosofia, de Matemática, de Biologia, etc. Quem não quer ser lobo não lhe
vista a pele (espera! este provérbio pode dizer-se? não sugere arrancar a pele
ao pobre do lobo para a vestir? mas se o lobo comeu a avozinha, talvez não faça
mal).
Em terra de cego esbugalhado quem tem olho é rei. Está mais
que provado. Mas por favor, não nos atirem reis nus, que a presunção é a mãe de
todas as asneiras. Senhores da Corte, por via das dúvidas, calai-vos, porque em
boca fechada não entra mosquito e poupam-nos ao disparate. Recomenda-se, em
alternativa, a leitura dos ditados populares, já que a demais parece ser coisa
complexa e supérflua nos tempos que correm.
A raposa tanto vai ao ninho que deixa lá o focinho. E o que
acontece depois? É certo e sabido que cada um se deita na cama que faz. Tomem
nota, senhores políticos: não gozem com o mal do vizinho que o vosso vem a
caminho. Águas passadas não movem moinhos, mas elas desenharam o leito do rio. Lembrem-se
sempre que quem com ferro mata, com ferro morre, e ao cair no chão, do chão não
passarão, mas comerão o pão que o diabo (vós próprios) amassou, aprenderão a
fazer omeletes sem ovos e a caçar com gato por não terem cão. Tem-se outra
perspectiva, quando a vida é vista a partir do chão.
Um homem prevenido vale por dois, e se vale a dobrar, em
política tem outro valor. A essa faculdade de «multiplicar-se»
nas demais opiniões chama-se autoridade. É pelo juízo crítico balizado na humanidade, que um homem
se faz grande, se faz actor político. Ser peixinho porque se é filho de peixe é
pouco. É preciso mais que isso, é necessário aprender a distinguir gatos
pardos, sobretudo à noite, e é obrigatório conhecer os espinhos da rosa. Deus
não tem nada a ver com isto, apenas ajuda quem madruga. Se ferradura trouxesse
sorte, o burro não puxava carroça.
Quem vos avisa, amigo é. Deixem de ser cavalos que voam com
esporas. Voem sem esporas, caramba, mas não se esqueçam que a pressa é inimiga
da perfeição. Matar dois coelhos de uma machadada só, em certos casos espicha
sangue para todos os lados. Reparem na galinha, animal que tomamos como burro
mas que enche o papo grão a grão. Façam como a galinha, senhores políticos, e alimentem-se
de juízo, grão a grão. Leite de vaca nunca matou bezerro.
Nada como um dia depois do outro (um dia da caça, outro do
caçador, segundo dizem). Por isso, cautela, porque enquanto nos atiram areia
para os olhos, vamos nós reparando nas diferenças dos gatos pardos da noite.
Somos macacos a aprender a distinguir os ramos secos. E se a César o que é de
César, um dia a Primavera far-se-á novamente com todas as andorinhas. Para bom
entendedor…
FernandaCunha/Dez2018